Pandemia escancara a falta de médicos intensivistas no Brasil

16/08/2021 16/08/2021 06:50 103 visualizações
Entre os muitos problemas do Brasil escancarados pela pandemia de Covid está a urgente necessidade de se investir na formação de médicos especializados em terapia intensiva. De acordo com levantamento da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), o país conta com 6.500 médicos intensivistas, sendo que seria necessário ter pelo menos cinco vezes mais profissionais para atender com plena capacidade em todos os leitos de UTI. Conforme dados da associação, Minas é o nono Estado brasileiro com maior proporção de intensivistas a cada 10 mil habitantes. A demanda ficou mais evidente durante os muitos chamamentos que hospitais do Estado fizeram ao longo da pandemia. Somente a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) realizou 139 chamamentos emergenciais para as diversas categorias que integram as equipes de UTIs (como enfermeiros e fisioterapeutas), mas em 38 editais não houve preenchimento total das vagas oferecidas. "Apesar da dificuldade de contratar profissionais, especialmente na Zona da Mata (Hospital Regional João Penido, Juiz de Fora) e na Região Noroeste (Hospital Regional Antônio Dias, Patos de Minas), as unidades referenciadas para o atendimento aos casos de coronavírus vêm trabalhando com remanejamentos internos de plantões para garantir a composição necessária das equipes", informou a Fhemig por nota. De acordo com Luiz Eduardo Parreiras Tálamo, vice-presidente da Sociedade Mineira de Terapia Intensiva (Somiti) e intensivista pediátrico no hospital São Camilo, é preciso que o país invista mais em vagas de residência médica para a área, para que os profissionais possam ganhar bolsas enquanto se especializam. Até o ano passado, para ser intensivista, um médico devia passar por uma residência anterior (pediatria, clínica, anestesia ou cirurgia), fazendo com que o processo de formação durasse de quatro a cinco anos. Atualmente, é possível se formar e já cumprir residência na terapia intensiva, mas nesse caso a duração da especialização é de três anos. “É importante que o poder público e os hospitais privados incentivem os médicos a trabalhar em UTI, especialmente titulados. Além do estresse do dia a dia que o intensivista tem que lidar, sim, e não é para todo mundo, ainda tem a questão de ser uma especialidade em que o médico vai ter plantões, trabalhando à noite e aos finais de semana”, diz Tálamo. Esse incentivo pode ser oferecido por melhores salários, que variam conforme a localização. “A remuneração para o intensivista muitas vezes não tem um diferencial para médicos de outros setores do hospital. E como é um setor de alta especialização, de alto estresse, de plantões difíceis, deveria ter uma remuneração mais adequada. Tanto no SUS quanto nos convênios privados”, completa. Principal motivação é salvar vidas Lucas Timm Pisoler, preceptor da residência médica para a área na Santa Casa de Belo Horizonte, explica que a principal motivação para uma pessoa se tornar intensivista é a vontade de salvar vidas. E é preciso ter prazer em trabalhar em hospital, porque diferentemente da grande maioria das especialidades, esta não oferece uma opção de atendimento em consultório. “Terapia intensiva não é a especialidade que lida com a morte, mas com a vida. A sociedade tem o conceito de que o CTI é um local de morte, mas é o contrário. A maior parte dos pacientes internados ali vai conseguir se recuperar”, afirma o médico, acrescentando que desistências são bastante incomuns entre residentes que optam por essa carreira. Enfermeiros também demandam incentivo Para ter mais UTIs no país, também é preciso investir na formação de outros profissionais fundamentais para o tratamento intensivo, como enfermeiros, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas. Para Natasha Preis, enfermeira e conselheira do Conselho Regional de Enfermagem em Minas Gerais (Coren-MG), a pandemia escancarou a falta de mão de obra capacitada para atuar na área. “Há uma complexidade maior do paciente. Muitas vezes a pessoa não tem uma comorbidade só, tem diabetes e hipertensão, por exemplo. É muito mais difícil tratar, é preciso que haja maior conhecimento”, explica a enfermeira. Para Natasha, é fundamental que o setor de saúde ofereça salários mais atrativos para que os profissionais sejam incentivados a investirem em especialização. “A Fhemig tem adicionais que melhoram a remuneração, mas de maneira geral não existe um diferencial expressivo. E a diferença do paciente é expressiva. Cada vez mais os enfermeiros assumem atividades mais críticas, como realizar uma punção de artéria”, completa.Image