Uma exposição de veículos militares blindados será feita hoje em frente ao prédio da Marinha, em Brasília. A exibição de tanques e armamentos é um evento programado pela Força e acontece no mesmo dia em que está prevista a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto impresso no plenário da Câmara. De acordo com um comunicado da Marinha, o evento marcará a entrega ao presidente Bolsonaro e ao ministro Walter Braga Netto (Defesa) de um convite para que as autoridades acompanhem, em 16 de agosto, um tradicional exercício da Força que ocorre desde 1988. O comboio começou o deslocamento no último domingo. Embora autoridades normalmente sejam chamadas a assistir à operação Formosa, que ocorre na cidade de mesmo nome em Goiás, é a primeira vez que o convite ocorrerá com uma exposição de blindados militares. Anualmente, há desfile militar na Esplanada dos Ministérios durante as celebrações do Feriado da Independência, em 7 de Setembro. De acordo com a assessoria de comunicação da Defesa, trata-se de uma ação de divulgação do exercício. Segundo a Marinha, a operação Formosa envolverá neste ano mais de 2.500 militares das três Forças – é a primeira edição de que Exército e Aeronáutica participam. No total, serão 150 diferentes equipamentos, entre carros de combate, blindados, aeronaves e lançadores de mísseis e foguetes. O objetivo é simular uma operação anfíbia. Questionado, o Ministério da Defesa não precisou quantos desses veículos estarão no desfile. “Nesta terça-feira (hoje), pela manhã, comboio com veículos blindados, armamentos e outros meios da Força de Fuzileiros da Esquadra, que partiu do Rio de Janeiro, passará por Brasília, a caminho do Campo de Instrução de Formosa”, informou a Marinha, em nota. “Cabe destacar que essa entrega simbólica foi planejada antes da agenda para a votação da PEC 135/2019 no plenário da Câmara dos Deputados, não possuindo relação com a mesma, ou qualquer outro ato em curso nos Poderes da República”, declarou a Força.
CONTEXTO
A presença de blindados nos arredores do Congresso ocorre em meio ao agravamento de uma crise institucional entre Bolsonaro e o Judiciário. O voto impresso, defendido pelo presidente da República, é o centro dos desentendimentos mais recente. Pauta prioritária do bolsonarismo, a PEC do voto impresso foi rechaçada numa comissão especial, mas o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), decidiu pautá-la em plenário. A tendência, porém, é que os deputados rejeitem a PEC. A proposta precisa ser aprovada por três quintos dos deputados, o correspondente a 308 votos favoráveis, em dois turnos de votação. Caso seja aprovado na Câmara, o texto seguirá para apreciação do Senado e dependerá da aprovação de, pelo menos, 49 senadores.
CONGRESSISTAS FALAM EM INTIMIDAÇÃO
A coincidência dos eventos provocou preocupação no Parlamento. “Sobre essa história de tanques nas ruas. Não quero crer que isso seja uma tentativa de intimidação da Câmara dos Deputados, mas, se for, aprenderão a lição de que um Parlamento independente e ciente das suas responsabilidades constitucionais é mais forte que tanques nas ruas”, escreveu no Twitter o vice-presidente do Congresso, deputado Marcelo Ramos (PL-AM). “Mais uma do protótipo de ditador: mandou o Exército desfilar com tanques em Brasília amanhã (hoje), dia da votação do voto impresso. Quer intimidar, mas para isso precisa do ‘intimidado’. É hora de mostrarmos pra ele que o poder emana do povo, não das armas!”, publicou o deputado Rogério Correia (PT-MG). Em rede social, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que “colocar tanques na rua” é demonstração de “covardia”. “Os tanques não são seus, pertencem à nação. Quer tentar golpe, sr. @jairbolsonaro? É o crime que falta para lhe colocarmos na cadeia”, publicou.
BOLSONARO CONVIDA AUTORIDADES PARA EVENTO
O presidente Jair Bolsonaro postou em suas redes sociais um convite para que autoridades como os presidentes das Casas Legislativas e do Judiciário, recebam também os veículos militares. “Sr. Presidente do ... STF, Câmara Federal, Senado, TCU, TSE, STJ, TST, Deputados, Senadores... : Como ocorre desde 1988, a nossa Marinha realiza exercícios em Formosa/GO. Como a tropa vem do Rio, Brasília é passagem obrigatória. Muito me honraria sua presença amanhã na Presidência (8h30), onde receberei os cumprimentos da Força e lhes desejarei boa sorte na missão”, divulgou em rede social Bolsonaro, que completa sua assinatura lembrando ser o “Chefe Supremo das Forças Armadas”.
Pavor Bolsonaro acusou ontem o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, de “apavorar” parlamentares contra o voto impresso e disse que a PEC sobre o tema, caso não haja negociação, será derrotada no plenário da Câmara. “O ministro Barroso apavorou alguns parlamentares, e tem parlamentar que deve alguma coisa na Justiça, deve no Supremo”, disse.
Carta aberta contra o STF Representantes de entidades conservadoras entregaram ao presidente Jair Bolsonaro uma carta aberta em que defendem o voto impresso, criticam a interferência do STF nos demais Poderes e pedem que as Forças Armadas “não se eximam de seu papel histórico” de garantir a estabilidade política, a lei e a ordem. (Fábio Zanini/Folhapress)
Ato Diante do anúncio da exibição de blindados hoje, o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) informou que organizará um ato de parlamentares no Congresso a favor da democracia. “Estou organizando um ato amanhã (hoje) em repúdio à tentativa do presidente de intimidar o Parlamento com tanques. Reuniremos um grupo de deputados na rampa do Congresso com cartazes em defesa da democracia”, afirmou ele.
‘COINCIDÊNCIA TRÁGICA’, DIZ LIRA
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que o evento com tanques na Esplanada dos Ministérios não é usual, mas
considerou uma “coincidência trágica” que ocorra no mesmo dia de análise do voto impresso pelo plenário da Casa. Lira admitiu a possibilidade de adiamento da votação ‘se os deputados quiserem e a população achar que é conveniente”. Ele defendeu que a discussão sobre o voto impresso cabe ao plenário, e não ao Judiciário ou ao Executivo, e disse esperar que a decisão dos deputados seja acatada com tranquilidade e respeitada pelos Poderes. “Nunca uma PEC criou tanta polêmica e esticou tanto a corda na relação entre os Poderes como a questão do voto impresso e do voto auditável”, disse. “Nossa expectativa é que as instituições, os Poderes, acatem com tranquilidade, respeitem e admitam que seu resultado será definitivo”, disse. Na avaliação dele, com 15 a 16 partidos contrários ao tema na Casa, as chances de aprovação da PEC seriam poucas. “E nesse caso, também, quem for vencido tem que serenar”, completou.