A decisão de Joe Biden de mandar investigar a origem do cornavírus reacendeu em todo o mundo o debate sobre o que causou a pandemia que já matou mais de 3,5 milhões de pessoas em todo o mundo. Na 4ª feira, o presidente dos Estados Unidos pediu à Comunidade de Inteligência norte-americana que redobre os esforços para investigar o caso e
solicitou um relatório com mais informações em 90 dias. Ele determinou áreas de investigação adicional, incluindo questões específicas sobre a China. Em sua declaração, o chefe do Executivo norte-americano afirmou que os EUA irão pressionar a China a participar de uma
“investigação internacional completa, transparente e baseada em evidências e fornecer acesso a todos os dados e evidências relevantes”. De acordo com Joe Biden, a Comunidade de Inteligência dos EUA
“se uniu em torno de 2 cenários prováveis” sobre a procedência do vírus, mas não chegou a uma conclusão definitiva. São eles:
- transmissão de um animal para humano;
- vazamento de um laboratório.
Os Estados Unidos querem apurar a responsabilidade chinesa sobre a origem da pandemia. Pequim age de maneira eficaz, fazendo prevalecer sua narrativa na mídia de vários países. Um estudo
relatado pelo Nieman Lab, laboratório de jornalismo de Harvard, mostrou que a China equipou a imprensa internacional para disseminar a sua versão sobre a covid-19 e os esforços chineses para combater a pandemia. O artigo mostra que a imagem internacional da China tornou-se mais positiva a partir da pandemia. O país tem 1,4 bilhão de habitantes e diz ter registrado menos de 5.000 mortos por covid-19 até agora, mas a confiabilidade dos dados relatados, inclusive sobre o número de casos e o começo da pandemia, é questionada pela comunidade científica internacional. Os estudos sobre a origem do vírus ainda são inconclusivos. Eis o que se sabe até agora:
- os primeiros casos de covid-19 foram identificados na cidade de Wuhan em dezembro de 2019;
- no começo de fevereiro de 2021, a OMS disse que a 1ª variante conhecida não surgiu no mercado de Wuhan, como se suspeitava desde o início da pandemia;
- no fim do mesmo mês, a organização encontrou sinais de cepas do vírus que teriam circulado em Wuhan antes de dezembro de 2019;
- investigação da OMS apontou que o cenário mais provável para a origem da pandemia é a transmissão do vírus para humanos por meio de outro animal;
- o mesmo estudo considerou “improvável” a versão de que o vírus vazou de um laboratório chinês em Wuhan;
- grupo de cientistas questionou a investigação da OMS e pediu uma pesquisa independente, com mais acesso a registros da China;
- uma reportagem do Wall Street Journal relatou que técnicos de laboratório do Instituto de Virologia de Wuhan teriam ficado doentes e procurado ajuda hospitalar em novembro de 2019, antes do 1º caso da doença ser confirmado.
A teoria sobre o vazamento do vírus de um laboratório tem ganhado mais plausibilidade entre a comunidade científica nos últimos meses. Um grupo de cientistas
publicou uma carta na revista
Science pedindo uma nova investigação sobre a origem do vírus. Eles afirmam que, embora não tenha havido nenhuma descoberta que apoie claramente um transbordamento natural ou um acidente de laboratório, a equipe da OMS avaliou um transbordamento zoonótico de um hospedeiro intermediário como
“provável a muito provável” e um incidente de laboratório como
“extremamente improvável”, mas as duas teorias não receberam uma consideração equilibrada pela OMS.
“Apenas 4 das 313 páginas do relatório e seus anexos abordavam a possibilidade de um acidente laboratorial. Notavelmente, o diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus, comentou que a consideração do relatório de evidências que apoiam um acidente de laboratório foi insuficiente e se ofereceu para fornecer recursos adicionais para avaliar totalmente a possibilidade”, dizem os cientistas. Os especialistas dizem que uma maior clareza sobre as origens da pandemia é necessária.
“Devemos levar a sério as hipóteses sobre spillovers naturais e laboratoriais até que tenhamos dados suficientes. Uma investigação adequada deve ser transparente, objetiva, baseada em dados, incluindo ampla experiência, sujeita a supervisão independente e gerida de forma responsável para minimizar o impacto de conflitos de interesse”. O grupo pede que agências de saúde pública e laboratórios de pesquisa abram seus registros ao público.
“Os investigadores devem documentar a veracidade e proveniência dos dados a partir dos quais as análises são conduzidas e as conclusões tiradas, de modo que as análises sejam reproduzíveis por especialistas independentes”, diz a carta.
POR QUE ISSO IMPORTA?
Por que a viabilidade da teoria de que a pandemia foi causada por um acidente em um laboratório chinês tem sido sustentada por mais pessoas na comunidade científica, inclusive por
pesquisadores que já haviam considerado a possibilidade praticamente descartada. A tese, que ganhou carga de teoria da conspiração, voltou a ser considerada por especialistas que investigam o tema. Apesar de a origem do vírus não ter grande impacto na definição das medidas para controlar a pandemia (que não dependem de como o vírus surgiu e incluem a vacinação e o distanciamento social) pode ter consequências significativas para a política internacional.
POSSÍVEIS IMPACTOS
Caso seja comprovada a tese de que o vírus vazou acidentalmente de um laboratório chinês, a comunidade internacional pressionará a China para assumir responsabilidades no combate global à pandemia, incluindo esforços relativos à vacinação mundial. Isso seria extremamente ruim para a imagem do país. Os Estados Unidos se aproveitariam dessa eventual situação para disseminar a narrativa norte-americana e atribuir a responsabilidade à Pequim. Ganhariam politicamente com isso, uma vez que EUA e China são adversários políticos e comerciais. Washington também poderá buscar penalizar a China por eventuais omissões de informações, caso encontrem evidências. No entanto, os estudos ainda são inconclusivos. A vice-secretária de imprensa da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, informou que depois da investigação e dos 90 dias, os EUA terão
“mais o que compartilhar”.