À polícia, Jairinho disse nunca ter atuado como médico, mas já teve receituário e deu plantões em hospitais, revela livro

17/12/2021 17/12/2021 06:34 106 visualizações
Preso acusado de cometer sessões de torturas que levaram à morte do menino Henry Borel, ex-vereador se formou na Unigranrio em 2004 e contou à polícia nunca ter exercido medicina

No dia 17 de março deste ano – nove dias após a morte de Henry Borel – o então vereador do Rio Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho, afirmou ao delegado Henrique Damasceno que, apesar de ser médico, não fez nenhuma manobra para tentar salvar Henry do que, a princípio, seria uma falta de ar.

Prontuário de Dr. Jairinho — Foto: Reprodução

Durante o interrogatório na sede da 16ª DP (Barra da Tijuca), Jairinho alegou que a última vez que fez massagem cardíaca em alguém foi no curso de Medicina da Unigranrio de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Mas a investigação sobre o ex-vereador revelaria o contrário.

Jairinho durante audiência da morte de Henry Borel, no Tribunal de Justiça do Rio, na terça-feira (14) — Foto: Brunno Dantas/TJ-RJ

Jairinho durante audiência da morte de Henry Borel, no Tribunal de Justiça do Rio, na terça-feira (14) — Foto: Brunno Dantas/TJ-RJ

Perfil detalhado

 

O livro também traz um perfil detalhado dos protagonistas do caso, que está sendo julgado pela Justiça fluminense. A jornalista entrevistou mais de cem pessoas e analisou mais de 20 mil arquivos, entre fotos, vídeos e trocas de mensagens, recuperados pela Polícia Civil dos celulares apreendidos com o casal – e que constam no processo no qual eles são réus.

A autora narra que, quando terminou o colégio, Jairinho decidiu estudar Medicina – com tio e primos dentistas, sempre disse que seguiria a área de saúde.

O ex-vereador prestou vestibular para instituições públicas e particulares, como o Centro Universitário Serra dos Órgãos, em Teresópolis, e a Faculdade de Medicina de Petrópolis, ambas na Região Serrana.

Ansioso antes das provas, não passou. Jairinho decidiu então voltar ao Pentágono para repetir, como ouvinte, o 3º ano do ensino médio. Fez também um cursinho preparatório no Miguel Couto, do Barra Shopping, e aulas de redação no Prioridade Hum, em Padre Miguel.

"Caso Henry - morte anunciada" mostra que, em 1998, ele foi finalmente aprovado para Medicina na Unigranrio. As mensalidades custavam, na época, o equivalente a dois salários mínimos, e eram pagas pelo pai, Coronel Jairo (atualmente deputado estadual).

Com aulas em horário integral, Jairinho gostava de, no intervalo, ir almoçar a comida da mãe, em Bangu, na Zona Oeste, a cerca de 30 minutos de distância de carro. Na época de provas, aproveitava as horas vagas para estudar na biblioteca da faculdade. Jairinho teve notas medianas ao longo do curso e se formou com o coeficiente de rendimento (CR) de 7,4.

O livro também relata que Jairinho tinha fama de inteligente, era bem articulado e gentil com professores e alunos; participava de dinâmicas em grupos e emprestava aos colegas os livros caros que comprava.

Nos últimos dois anos da graduação, Jairinho fez o internato, período em que pôde colocar em prática atendimentos a pacientes com a supervisão dos professores da Unigranrio.

Passagens por hospitais

Ele passou pelo Hospital Estadual Adão Pereira Nunes, em Caxias; pelo Hospital Maternidade Xerém, no mesmo município, onde atuou nas áreas de ginecologia e obstetrícia; e pelo Hospital Quinta D’Or, em São Cristóvão, na Zona Norte do Rio.

Jairinho se formou em medicina no primeiro semestre de 2004, aos 26 anos. No segundo, mesmo sem ter o diploma nas mãos, adotou o nome Dr. Jairinho e começou a primeira campanha a vereador com o slogan "O médico que vai cuidar do Rio", seguindo os passos políticos do pai.

Desde então, venceu cinco eleições consecutivas na Câmara Municipal do Rio. Durante uma perícia complementar, em abril, no condomínio Majestic, no Cidade Jardim, na Barra, onde ele morava com Monique e Henry até a morte da criança, um livro chamou a atenção dos investigadores: "Medicina de urgência", um guia da Escola Paulista de Medicina, da Universidade Federal de São Paulo, de Elisa Mieko Suemitsu Higa e Álvaro Nagib Atallah, publicado justamente em 2004.

g1 entrou em contato com a defesa de Jairinho, mas não teve resposta até a última atualização desta reportagem.

Atualmente, Jairinho está preso preventivamente na Cadeia Pública Pedrolino Oliveira, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, e Monique no Instituto Penal Oscar Stevenson, em Benfica.