CONSTITUIÇÃO ESTADUAL X FEDERAL - Polícia científica pode ser autônoma, mas sem status de órgão de segurança, diz STF
25/06/202025/06/2020 11:21 166 visualizações
Ao estabelecer a existência da polícia técnico-científica, o legislador estadual pode defini-la de maneira autônoma e independente, sem necessariamente submetê-la às polícias existentes e dispostas no artigo 144 da Constituição Federal. Mas desde que isso não signifique sua equiparação a órgão de segurança pública.Com esse entendimento, o plenário do Supremo Tribunal Federal deu parcial procedência a ação direita de inconstitucionalidade para dar interpretação conforme ao termo "polícia científica", presente no artigo 50 da Constituição Estadual do Paraná. A decisão afasta "qualquer interpretação que confira a esse órgão o caráter de órgão de segurança pública". O julgamento havia sido paralisado em novembro de 2014 por pedido de vista do ministro Teori Zavascki, que morreu em 2017. Sucessor na cadeira, o ministro Alexandre de Moraes retomou o caso com a leitura do voto. A decisão se deu por maioria em que prevaleceu o voto do relator, ministro Dias Toffoli. Originalmente, o caso foi julgado em conjunto com a ADI 2.616, na qual o Supremo declarou a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional paranaense 10/2001, que acrescentava a polícia científica no rol de órgãos de segurança pública. À época, a corte entendeu que o texto feria o artigo 144 da Constituição Federal, que é restritivo: estabelece as polícias federal, civil e militar. O ADI julgada nesta quarta também contestou — "inteligentemente", segundo relator — o artigo 50 da Constituição Estadual em sua forma original, que estabelece uma polícia científica "com estrutura própria, incumbida das perícias de criminalística e médico-legais, e de outras atividades técnicas congêneres, será dirigida por peritos de carreira da classe mais elevada, na forma da lei".O que é autonomia e subordinação? Todo o plenário concorda quanto à necessidade de a polícia científica ser autônoma e independente, de forma que possa trabalhar na produção de laudos periciais e exames sem submeter-se a delegados e policiais, como ocorria durante a ditadura. Para o relator, a aplicação da interpretação conforme, afastando o caráter de órgão de segurança pública, resolve a questão. Abriu a divergência, ainda em 2014, o ministro Luís Roberto Barroso, que entende que a polícia científica pode e deve ser autônoma e independente, porém dentro da estrutura de um dos órgãos de segurança pública estabelecidos pela Constituição Federal. Normalmente, ela se enquadra junto à polícia civil. "Não houve criação, por parte da Constituição Estadual do Paraná, dessa polícia ou desse órgão. O que se fez para garantir a autonomia e a independência de atuação foi constitucionalizar o princípio, a ideia de autonomia. Sem qualquer criação de cargo, de estrutura", disse o ministro Alexandre de Moraes, que seguiu o relator. O ministro Luiz Fux levantou a questão. "Autonomia e independência são antinômicas com o fato de pertencer à polícia civil. Com autonomia, a polícia científica pode vir a atuar em contraste com as outras polícias. A polícia civil pode pedir uma perícia e ela dizer 'não vou fazer porque sou autônoma, independente e acho que essa perícia não é necessária'. Isso deveria ficar bem claro", destacou. "Por isso a interpretação conforme para não considerar órgão de segurança pública", respondeu o ministro Dias Toffoli. Na sequência, o ministro Alexandre de Morais exemplificou estados em que esse formato é praticado e resumiu: "a polícia científica é órgão auxiliar autônomo". "Acho estranho sustentar a ideia de que a polícia técnica não integre o aparato da segurança pública em geral; me parece que é da natureza dela. Tem que ser autônoma, porque realiza procedimento investigatório sem subordinação ao delegado do caso. Mas ela não é gênero à parte. A Constituição Federal só prevê a PF, civil e militar. Não prevê uma científica. Ela pode e deve ser autônoma, mas dentro da estrutura da secretaria de segurança pública, no mínimo", disse o ministro Barroso. Ao votar, o ministro Ricardo Lewandowski seguiu o relator e fez esclarecimento. "O que o legislador estadual quis dizer é que carreira da polícia cientifica não se confunde com a carreira da civil", afirmou. Por isso, não se trata de órgão autônomo. Nova divergência O voto do ministro Luiz Edson Fachin abriu terceira linha de divergência, segundo a qual os estados detêm plena autonomia para legislar sobre determinada matéria caso competência não tenha sido exercida pela União. "Podem garantir autonomia a seus institutos de criminalística, e podem integrá-los aos demais órgãos de segurança pública sem que isso importe em ofensa material à Constituição Federal", apontou. Ao fim, prevaleceu o entendimento do ministro Dias Toffoli, seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello. A divergência aberta pelo ministro Barroso foi seguida pelo ministro Luiz Fux. E ficaram vencidos ao considerar improcedente a ADI os ministros Luiz Edson Fachin e Marco Aurélio.