POLÍCIA CIVIL: ENTENDA A SUA ATUAÇÃO EM 5 TÓPICOS

03/09/2018 03/09/2018 11:11 285 visualizações
Se você já fez o famoso “B.O” (Boletim de Ocorrência), provavelmente, conversou com um Policial Civil. E se leu as últimas notícias sobre a morte da vereadora Marielle Franco, reparou que quem investigará o assassinato é a Polícia Civil. Mas você sabe por que vamos às delegacias desta polícia para relatar crimes? Entenda melhor.

1) POR QUE EXISTE A POLÍCIA CIVIL?

A Polícia Civil surgiu pela necessidade de uma entidade fiscalizadora que fizesse com que as leis fossem cumpridas e levasse à justiça quem não seguisse as normas. Há indicativos da atuação de uma polícia que investigava no território brasileiro desde 1530, comandada pelo Reino Português. Essa patrulha ficou conhecida como Polícia Judiciária. Somente em 1808, com a chegada do príncipe Dom João ao Brasil, a polícia começou a ser estruturada, comandada por um delegado e composta por escrivães e agentes. Na época, uma das principais funções desta organização era se prevenir de espiões europeus e fiscalizar embarcações. A polícia, então, também começou a ser chamada de Civil, como uma forma de diferenciá-la de outras formas de policiamento, por seu caráter investigativo. Em 1871, uma nova constituição separou os conceitos de Justiça e Investigação Policial, criando duas funções distintas para cada. Assim, nesta lei foi criado o Inquérito Policial – um documento que registra toda a investigação feita pela polícia e, depois, é usado por órgãos da Justiça para fazer uma denúncia criminal. A Polícia Civil só foi reconhecida nas configurações de hoje por meio da Constituição de 1988, que determina as funções de cada órgão de segurança do país. No artigo 144, a legislação esclarece que a Polícia Civil tem como atribuição assegurar o cumprimento da legislação e investigar crimes cometidos nos estados brasileiros. É de competência dos Governadores do estado e Distrito Federal comandar a Polícia Civil, sendo que cada uma delas pode ter regimentos internos que sigam as leis estaduais.

2) O QUE FAZ A POLÍCIA CIVIL?

De forma simplificada, a função dos Policiais Civis é investigar todos os crimes que aconteçam no estado, exceto os militares, e garantir o cumprimento da lei, fiscalizando e cumprindo mandados judiciais.
Na investigação dos crimes, os policiais são responsáveis por fazer perícias e recolher depoimentos para construir o Inquérito Policial. O inquérito  deve ter informações completas e possíveis de se provar, pois servirão como base para as denúncias criminais que serão feitas pelo Ministério Público. Depois da denúncia feita, o processo será julgado. Além disso, é de responsabilidade da polícia cumprir os mandatos judiciais quando expedidos, como de apreensão (de bens, documentos, objetos) e prisão. Também é função da Polícia Civil manter um banco de dados atualizado sobre a população, sendo o órgão responsável pela emissão de Carteiras de Identidade e Atestados de Antecedentes Criminais. Por fim, a Polícia Civil também deve autorizar a realização de grandes eventos e fiscalizar atividades comerciais locais.

Como é dividido o trabalho da Polícia Civil?

O Delegado Geral de Carreira é quem comanda a Polícia Civil, sendo responsável pela parte da administração geral. É o Delegado Geral quem responde por toda a atuação da Polícia Civil, distribuição de verba entre as delegacias, prestação de contas para a Secretaria de Segurança do Estado e administração dos casos. Outros delegados são subordinados a ele e divididos em departamentos com diferentes funções. Inicialmente, os casos são separados por território – Polícia da Capital e Metropolitana ou do Interior. Cada uma delas possui delegacias circunstanciais para atender ocorrências na região em que é responsável. No interior, é comum que uma delegacia responda por uma ou mais cidades e, na capital, por bairros e regiões metropolitanas. Para apoiar as delegacias regionais, os casos são distribuídos também em unidades da Polícia Especializada, que surgiram para proporcionar um conhecimento específico em infrações de determinada temática, como  crimes de informática, sequestros, roubos de veículos, proteção ao meio ambiente. Estas pesquisam sobre o tema, realizam ações de pre­venção, proteção e investigação de crimes. Uma das delegacias especializadas com maior atuação no Brasil é a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM), que trabalha para combater crimes de violência doméstica e sexual, principalmente atuando na solicitação de medidas protetivas de urgência ao juiz, nos casos de violência familiar.

Corregedoria da Polícia Civil

Compete à Corregedoria garantir as boas práticas policiais e corrigir as infrações cometidas por qualquer policial civil, independentemente do cargo ocupado, como negligência, mau atendimento ou corrupção. As investigações são sigilosas e, caso comprovada a infração, se torna uma ação civil penal. Cabe à corregedoria, também, a função administrativa de centralização de todos os inquéritos e a distribuição dos casos entre os departamentos. A Corregedoria foi criada com objetivo de apoiar o Delegado Geral e, em vários estados brasileiros, o departamento é subordinado à Delegacia Geral do estado. Entretanto, ao longo do tempo, inúmeros casos de corrupção dentro da organização foram denunciados e trouxeram questionamentos sobre a credibilidade do departamento. Assim, algumas ações surgiram pelo país para garantir sua legitimidade. No Piauí, por exemplo, a corregedoria mudou sua filiação para a Segurança Pública do Estado em 2004. Já no Rio de Janeiro e Espírito Santo, foi criada a Corregedoria Geral Unificada, também subordinada à Secretaria de Segurança, que fiscaliza todos os órgãos policiais – inclusive suas corregedorias.

Polícia Civil x Polícia Federal

As Polícias Civil e Federal possuem características muito semelhantes em sua atuação, porém, uma é focada em crimes locais e a outra, em infrações que envolvem toda a nação. A Polícia Civil, no entanto, pode participar de operações interestaduais. Um exemplo é quando um criminoso condenado foge de um estado para outro. Neste caso, as Polícias dos dois territórios devem estar cientes do ocorrido e, em conjunto, trabalharem na operação. A Polícia Federal só seria envolvida se o infrator ultrapassasse uma fronteira e se tornasse um fugitivo internacional.

Polícia Civil x Polícia Militar

Já a Polícia Militar difere completamente da Polícia Civil, tendo caráter preventivo e ostensivo, o que quer dizer que ela deve antecipar a prática de um crime e dar à população a sensação de segurança. Por este motivo, a Polícia Militar está sempre fardada. Já os policiais civis, em sua maioria, não são identificados, para que possam se infiltrar com facilidade nos ambientes. A Polícia Militar tem como objetivo prender o suspeito em flagrante, mas caso não aconteça, a investigação passa à Polícia Civil, que deve ter acesso a tudo que foi feito pela Polícia Militar no início do processo. Em alguns casos, existe uma falha na comunicação entre as duas polícias, sendo motivo de dificuldade na solução de alguns casos.

3) QUEM FAZ PARTE DA POLÍCIA CIVIL?

Vejamos algumas das funções importantes dentro da Polícia Civil: Delegado: A função de um delegado é supervisionar, coordenar e planejar as atividades policiais e, principalmente, conduzir as investigações, solicitar medidas protetivas ao Juiz e administrar as delegacias. Para isso, ele precisa ter estudado Direito, feito concurso público e ter vasto conhecimento da área policial e judicial. Cada delegado é responsável pelo departamento que lhe é designado, dentro da região estipulada pela administração e/ou temática específica de investigação. Agente: Os agentes são os policiais que executam as tarefas ditadas pelo delegado. São responsáveis pela ação nas operações, tanto em investigação de crimes, na fiscalização de comércio, na proteção de autoridades, policiamento em eventos e execução de mandatos.
Escrivão: O escrivão é quem escreve o inquérito policial e realiza serviços cartorários da polícia. Ele supervisiona e fiscaliza o cumprimento das formalidades exigidas pela justiça para o processo ser válido. Perito Médico-Legista: este perito reúne provas relacionadas às pessoas envolvidas em um crime. Ele faz o exame clínico e de laboratório em vítimas e realiza necropsias. Perito Criminal: reúne provas nos locais de crime, como objetos e instrumentos utilizados para a prática de infrações, veículos, documentos, mercadorias, tóxicos e produtos químicos. Ele realiza exames balísticos, de DNA e outros, para complementar e embasar as investigações feitas pelos agentes. Perito Papiloscopista: é responsável pela identificação civil da população, sendo mais conhecido na prática de retratos falados. Ainda, é responsável pela pesquisa em banco de dados e engenharia de softwares, relacionados ao controle e identificação de pessoas envolvidas nas infrações.

4) COMO FUNCIONA A INVESTIGAÇÃO DE UM CRIME?

1) Primeiro, deve-se chamar a Polícia Militar, que atuará no momento do crime. A PM tentará fazer a prisão em flagrante. Caso não seja possível, os policiais militares farão o primeiro reconhecimento e o isolamento da área, para preservar as provas. Eles chamarão a Polícia Civil para investigar o caso. 2) Na cena, a Polícia Civil recolhe depoimentos de testemunhas e, os peritos, provas para análise em laboratório. Se o proprietário do veículo não for a vítima fatal, ele faz um Boletim de Ocorrência para garantir seus direitos, caso o automóvel seja utilizado na prática de outros crimes posteriormente. 3) Na delegacia, a Polícia Civil abrirá uma investigação, ou seja, irá instaurar um inquérito. Caso seja necessário, são feitos outros depoimentos e utilizados recursos como o retrato falado. Enquanto isso, os peritos farão seu trabalho de polícia científica, realizando os exames de balística, pesquisas em banco de dados e necropsia. 4) O Inquérito Policial reúne os laudos e detalhes de toda a investigação, com a conclusão que a Polícia chegou sobre o caso. A Polícia tem até 30 dias para conceder o primeiro parecer ao Ministério Público. Se a investigação não for o suficiente para denunciar o autor, a Polícia Civil pode solicitar um prazo maior para as investigações. 5) Quando o autor do crime é identificado, o Delegado solicita a denúncia ao Ministério Público contra o suspeito e a prisão preventiva. Se o Ministério Público achar que o relatório está completo, envia a solicitação ao Juiz, que pode aceitar, ou não, a denúncia. 6) Caso a investigação policial seja inconclusiva depois de muito tempo, o Inquérito pode ser arquivado. No entanto, o mesmo pode ser reaberto, mesmo que anos depois, caso outras provas sejam apresentadas. 7) Se for aceita, o inquérito se transforma em uma ação penal, passando por todo o processo de julgamento até a sentença final. Os mandatos de prisão que forem expedidos são de responsabilidade da Polícia Civil para serem cumpridos.

5) PRINCIPAIS PROBLEMAS ENVOLVENDO A SOLUÇÃO DE CRIMES PELA POLÍCIA CIVIL

Segundo a OMS, o Brasil é o nono país com maior taxa de homicídios no mundo. Somente em 2016, 54 mil pessoas foram vítimas, o que significa um homicídio doloso (assassinato com intenção de matar) a cada 10 minutos no país. Os dados demonstram uma grande quantidade de crimes a serem investigados pela polícia todos os dias, mas o índice de resolução destes ainda é incerto. O Conselho Nacional do Ministério Público identificou que entre março de 2010 e abril de 2012, 78% dos inquéritos foram arquivados por impossibilidade para se chegar aos autores, principalmente por conta da demora entre a ocorrência do crime até a revisão dos inquéritos pelo MP. No Brasil, apenas seis estados sabem quantos homicídios aconteceram durante o ano e resultaram em denúncia feita pelo Ministério Público. O relatório “Onde Mora a Impunidade”, lançado em dezembro de 2017 pelo Instituto Sou da Paz, denunciou esta situação, propondo a aplicação de um indicador que padronize e armazene dados sobre as investigações da Polícia Civil. O Instituto trabalha há 15 anos para reduzir a violência no Brasil. Neste estudo, os pesquisadores identificaram que o MP denuncia menos de 15% das mortes violentas. As razões apontadas são a fragilidade das provas, a falta de estrutura pericial, a precariedade para o isolamento e preservação dos locais de crime e a demora da condução dos inquéritos. Para a elaboração do relatório, os 27 estados brasileiros foram convidados a contribuir com dados em relação às denúncias criminais de homicídios dolosos entre janeiro de 2015 e junho de 2017. Entre as informações solicitadas, estavam o número do processo, data do registro policial, data do fato, número do inquérito e município de ocorrência. Apenas seis estados responderam adequadamente à pesquisa, fornecendo a porcentagem de denúncias feitas no período. Sendo eles, Pará (4,3%), Rio de Janeiro (11,8%), Espírito Santo (20,1%), Rondônia (24,6%), São Paulo (38,6%), Mato Grosso do Sul (55,2%). Os estados que não colaboraram indicaram a falta de integração entre a polícia e o Poder Judiciário para a obtenção de informações e muitos forneceram dados incompletos, que inviabilizaram o cálculo do indicador. A proposta da ONG com o relatório foi pressionar as autoridades dos estados, órgãos legisladores, de justiça e segurança pública, para que tragam o assunto para a pauta do Congresso Nacional e promovam mudanças que padronizem os registros e procedimentos. A sugestão da ONG para o Governo é que, através de um indicador, consolidem-se boas práticas de investigação e planejamento de forma conjunta e estratégica, tornando o processo mais eficaz. Fonte: politize