A triste realidade da decadência da Polícia Judiciária no Brasil e em Rondônia

24/01/2018 24/01/2018 19:00 311 visualizações
*Rodrigo Augusto M. Marinho As Polícias Civis são instituições históricas, que exercem funções de polícia judiciária, nas unidades federativas do Brasil, cuja função é, de acordo com o artigo 144 da Constituição Federal de 1988, o exercício da segurança pública. As polícias civis são subordinadas aos Governadores dos Estados ou do Distrito Federal. Ainda de acordo com o artigo 144, § 4º, da Constituição Federal, que especifica o papel das Polícias Civis, são funções institucionais destas, ressalvada a competência da União:
  • apurar infrações penais, exceto as militares, e;
  • O exercício das funções de polícia judiciária.
Atualmente, as Polícias Civis, originárias de 1808, continuam integradas por servidores públicos com estatuto civil, com funções instituídas no artigo 144 parágrafo 4º da Constituição Federal, a elas incumbindo às funções de polícia judiciária e a apuração das infrações penais, enquanto, pelo parágrafo 5º do mesmo artigo, cabe, às Polícias Militares estaduais, a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública bem como infrações penais militares no âmbito estadual. Encontra-se em crise a polícia judiciária brasileira. Em tempos de crescente e vertiginosa violência nas capitais brasileiras, a sociedade chega a questionar o papel da polícia na repressão ao crime. A discussão travada entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária sobre a ação investigativa e a titularidade deste trabalho, elevou o questionamento acerca da função policial, seu trabalho na investigação criminal e a importância do inquérito policial, peça que é considerada dispensável para a propositura da ação penal. Neste sentido, devemos pensar que o momento mais importante na persecução criminal acontece no calor dos acontecimentos, exatamente quando, nos crimes que deixam vestígio, a polícia isola o local do crime e toma providências para que nada seja alterado até a chegada da perícia. Assim sendo, um erro do policial pode ser suficiente para invalidar toda uma investigação e o futuro de um processo, ou seja, apesar de ser o inquérito, uma peça considerada “dispensável”, uma investigação mal conduzida acarretará futuramente a inviabilidade do processo, ou seja, o Estado falhará na punição dos autores dos delitos, e com isto aumentar-se-á os crimes e as suas reincidências, como vem acontecendo neste estado com um aumento que chega até 400% em relação aos anos anteriores. É justamente durante a investigação, no calor das emoções, quando a memória do crime está recente, que se pode chegar, com mais facilidade, na sua autoria e materialidade. É justamente a equipe que primeiro chega ao local do crime, e que investiga inicialmente que tem os elementos e subsídios importantes para a identificação da assinatura do crime. Vejam quão importante é o trabalho policial, que embora seja o inquérito policial, peça dispensável, não vem sendo esta a prática comumente adotada no Brasil, onde a grande maioria dos processos penais, o IPL está autuado, servindo de prova para a representação dos ilícitos. Recentemente me deparei, e aqui rendo elogio e apoio, ao Delegado Victor de Santana Menezes, que em despacho para encaminhar corretamente um IPL ao juiz de direito, cujo “parquet” teria pedido arquivamento de um IPL e encaminhado incorretamente a Delegacia de Polícia, mostrou o que é ser polícia, o mister, a realidade e o amor pela profissão. No despacho em que requer o arquivamento do feito teria, o sobredito parquet, corroborando com este artigo, asseverou “a falência da segurança pública já foi decretada, faltando apenas fechar as portas”. Ora, isto é inquestionável! E o que tem sido feito para se reverter este quadro? Concordamos com o sobredito Delegado, que desabafou: “Ao invés de nos auxiliar, o que aparenta é que o controlador externo quer nos extinguir”. Esta talvez seja uma diferença, um policial jamais desistiria de uma investigação, por falta de condições. Estamos sofrendo um desmonte silencioso, a sociedade, desta forma, necessita de uma polícia eficiente, viaturas em número suficiente e qualidade, polícia firmemente armada e treinada, aparato tecnológico, conhecimento técnico, enfim, para que se possa prestar um serviço de segurança pública de excelência, que é direito de todos neste País. Não é raro, encontrarmos um cidadão que ao chegar numa delegacia de polícia, ouvir que não tem servidores, viaturas e até mesmo uma simples impressora para se entregar uma cópia da ocorrência policial registrada. O direito de segurança, disposto na Constituição Federal, não pode ser preterido por um governo. O modelo de segurança está arcaico. Devemos repensar a segurança pública, já éramos para ter deixado, na prática, de ser polícia de governo para ser polícia de Estado. De tempos, a Polícia Judiciária, neste Estado de Rondônia, vem sofrendo um notório desaparelhamento, o que é flagrante e grave. Onde a falta de contingente, e delegacias ultrapassadas que mais assemelham-se às masmorras, policiais civis trabalhando em ambientes totalmente insalubres, sem local adequado ao atendimento do cidadão, que ficam expostos, isso é facilmente percebido por qualquer pessoa que compareça às unidades policiais do Estado. Quanto a este tópico, a Polícia Civil de Rondônia está na UTI, pois hoje está com um quadro altamente defasado, precisando, urgentemente, de cerca 800 novos servidores. E mesmo assim, a falta de políticas públicas que deveriam criar uma a carreira policial sólida e consistente, está sendo o principal motivo das evasões. Recentemente, vimos estampadas pela mídia Rondoniense as manchetes: “PC vive de doação no interior” onde uma cidadã de Rolim de Moura, ao se dirigir a uma unidade de polícia para registro de ocorrência, ficou sensibilizada com o que viu, e doou do próprio bolso, materiais de limpeza para a delegacia. Em Rondônia, ainda na contramão de tudo isso, por falta justamente de efetivo e condições, fecharam-se na Capital, duas delegacias, a 6ª e 8ª DPs, delegacias estas criadas desde a época do ex-território, e só não fechou dezenas de outras ainda, porque, pasmem, mesmo com o tempo fechado para a aposentadoria, os policiais civis, não estão conseguindo de forma célere, pois o Estado tem criado burocracias e embaraços, tendo processos de aposentadoria, com mais de dois anos tramitando, junto ao Instituto de Previdência do Estado. Dentro desse contexto de precariedade, os policiais sentem-se envergonhados, especialmente por que não se sentem valorizados pelos gestores públicos. E porque veem os altos índices de criminalidade aumentar assustadoramente, e que mesmo trabalhando arduamente, com o que têm e pode, se sentem de mãos amarradas à espera que o Governo, possa investir, seriamente, na Segurança Pública. A propósito, em magnífica matéria sobre a ausência de autonomia da Polícia Judiciária, Luiz Flávio Gomes e Fábio Scliar lecionam: “A preocupação com a ausência de autonomia da Polícia Judiciária é justificável em função da crescente importância que a investigação criminal vem assumindo em nossa ordem jurídica, seja por conta de uma necessária mudança de postura a seu respeito, para considerá-la como uma garantia do cidadão contra imputações levianas ou açodadas em juízo, seja pelo papel mais ativo que tem sido desempenhado nos últimos tempos pelos órgãos policiais”. Mais adiante, os professores acrescentam: “Esta ausência enfraquece a Polícia Judiciária e a torna mais suscetível às injunções dos detentores do poder político, e considerando a natureza e a gravidade da atribuição que exerce, bem como os bens jurídicos sobre os quais recai a sua atuação, o efeito pode ser desastroso em um Estado Democrático de Direito”. Na visão de outro grande processualista penal, José Frederico Marques, a Polícia Judiciária necessita de uma estrutura organizacional e de garantias que possibilitem o desenvolvido de seu mister com imparcialidade e isenção. “De tudo se conclui que a polícia judiciária precisa ser aparelhada para tão alta missão, tanto mais que o Código de Processo Penal a prevê expressamente no art. 6º, item IX. Para tanto seria necessário uma reforma de base, tal como preconizaram Sebastián Soler e Velez Mariconde na Exposição de Motivos do Código de Processo Penal de Córdoba, em que se estruturasse a polícia judiciária em quadros próprios, separando-a da polícia de segurança e da polícia política. Reorganizada em bases científicas, e cercada de garantias que a afastem das influências e injunções de ordem partidária, a polícia judiciária, que é das peças mais importantes e fundamentais da justiça penal, estará apta para tão alta e difícil tarefa”. O jurista Fábio Konder Comparato, em entrevista concedida ao site Terra Magazine, defende que as Polícias Judiciárias - Polícias Civis, dos Estados, e a Polícia Federal - sejam autônomas em relação ao Poder Executivo. O conceituado professor entende, ainda, que: “A polícia de segurança (Militar) tem que ficar sob comando do Executivo, porque ela tem que intervir imediatamente, tem que manter a ordem pública. Mas a polícia judiciária não pode ficar submetida ao Executivo, porque ela é um órgão essencial para o funcionamento do sistema judiciário”. A Polícia Judiciária brasileira, mesmo sucateada e sem aparatos tecnológicos, é elogiada internacionalmente, pelos altos índices de elucidação de crimes. Não é raro ver policiais brasileiros, saindo destas fronteiras, para dar instrução às outras forças policiais pelo mundo afora. O que precisa é simples: Investimento na área! É de se esclarecer que mesmo não estando com a devida valorização, sobretudo durante deste Governo, a PC/RO já configurou em diversas ocasiões colocando em destaque nacional o Estado de Rondônia, como uma das três policias mais honesta do Brasil, além disto a média nacional de elucidação de crimes, é de 2 casos a cada 10, no Estado de Rondônia, mesmo com todas as mazelas e falta de reconhecimento do Governo, a estatística é de 7 a cada 10 casos. Ainda em Rondônia foi editado o Decreto n° 21.256 de 13 de setembro de 2016, em que autoriza a elaboração de Termo Circunstanciado de Ocorrência pela Polícia Militar, o que já se assentou na suprema corte ser inconstitucional. O TCO é um documento mais elaborado do que o Boletim de Ocorrência, e se constitui em peça que substitui o inquérito policial, em crimes de menor potencial ofensivo. São exemplos de crimes menores, a lesão corporal de natureza leve, omissão de socorro, calúnia, difamação, injúria, constrangimento ilegal, ameaça, violação de domicílio e crime de dano, todos previstos no Código Penal. No estudo feito, cada ocorrência dessa natureza demanda o mesmo tempo e procedimento que seria dado a uma ocorrência de maior vulto, como crime de roubo. Também a crescente corrente das terceirizações das carteiras de identidades, não restam dúvidas que desafoga, a curto prazo, o serviço dos servidores envolvidos com a mesma, contudo é uma solução meramente política e paliativa, não se demorará muito para vermos o aumento de erros, duplicidades e falsificações, acerca do documentos, além do mais demonstra que é mais fácil investir em outros órgãos, do que na própria Instituição policial. Diante todo o exposto, pode facilmente concluir que estão dando cabo à um plano de enfraquecimento da polícia judiciária no Brasil. A polícia civil do Estado de Rondônia, apesar do excelente trabalho que vem desempenhando, está perdendo para a falta de aparelhamento necessário,  e já está enterrada até o queixo, e é por isto que a criminalidade vem aumentando, se algo não for feito, se não houver gritos, será enterrada de uma vez. E contra isto, vamos continuar gritando para que a polícia civil de fato, tenha suas premissas respeitadas, e que sejam equipadas e preparadas para que se possa prestar um serviço de Segurança Pública de excelência, a que todo cidadão faz jus.   *Rodrigo Augusto M. Marinho Presidente do Sindicato dos Servidores da Polícia Civil de Rondônia-SINSEPOL